A 21 de maio de 2022 celebra-se, em Portugal, o Dia Nacional de Luta contra a Obesidade. Neste artigo, explicamos a importância da saúde intestinal para a prevenção desta doença.
Considerada uma doença crónica, a obesidade está associada a um risco acrescido de várias outras doenças – tais como doenças cardiovasculares, diabetes mellitus, distúrbios musculoesqueléticos, cancro, asma, embolia pulmonar, doença na vesícula biliar e síndrome metabólica. Além disso, à obesidade está associado um aumento da mortalidade.1
Segundo os dados mais recentes sobre obesidade do Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge, em 2015, 28,7% da população portuguesa adulta (entre os 25 e os 74 anos) sofria de obesidade, o que representou uma duplicação, num período de 10 anos (face a 2005). Além disso, é de notar também que, segundo o mesmo estudo, 38,9% dos adultos portugueses apresentavam excesso de peso.2
Existem vários fatores que podem contribuir para o desenvolvimento de obesidade, entre os quais se inclui a genética, a não prática de atividade física e a ingestão alimentar excessiva.3 Além disso, mais recentemente, tem sido também estudada a influência da composição da microbiota intestinal para o aumento do risco de obesidade.4,5
Vejamos, então, qual a relação entre a composição da microbiota e a obesidade.
Microbiota intestinal e risco de obesidade
Está provado que a nossa saúde intestinal, nomeadamente a composição da microbiota, influencia, de forma geral, a nossa saúde.4 Tanto assim é que, hoje em dia, o intestino é até chamado de “segundo cérebro”.6 Neste sentido, o risco de obesidade é também influenciado pela composição da microbiota.4
Como explicamos neste artigo, o termo microbiota intestinal (hoje em dia, usado em substituição do termo “flora intestinal”) refere-se ao vasto conjunto de bactérias, vírus, fungos e outros seres microscópicos que habitam o nosso intestino.7 As suas principais funções passam não só pela digestão dos alimentos que ingerimos, mas também pela síntese das vitaminas e pelo metabolismo, sendo responsáveis por aumentar a produção de energia para o nosso corpo, a partir dos alimentos.6
Sendo a composição da microbiota intestinal diferente de indivíduo para indivíduo8, mais de 90% da sua composição é feita em torno de dois tipos de bactérias: os firmicutes (vulgarmente chamados de “bactérias más”) e os bacteroidetes (conhecidos por “bactérias boas”).3 Para que a microbiota seja considerada saudável e equilibrada, idealmente, o número de bacteroidetes deve ultrapassar o número de firmicutes.9
Ora, o que os estudos realizados em pessoas obesas têm revelado é que, comparativamente com indivíduos magros, a microbiota intestinal de quem sofre de obesidade tende a apresentar um rácio de firmicutes superior ao de bacteroidetes.5 Uma das razões pelas quais a abundância de firmicutes poderá explicar a ligação à obesidade é o facto de este tipo de bactérias serem mais eficientes na recolha de energia a partir dos alimentos, causando uma maior absorção de calorias o que, consequentemente, se reflete em aumento de peso.3
O que pode contribuir para desequilibrar a microbiota intestinal?
A composição da nossa microbiota é altamente influenciada pela nossa dieta. Deste modo, a ingestão de uma dieta rica em açúcares e gorduras é uma das principais causas para a abundância de “bactérias más” (ou seja, firmicutes).4,6 Pelo contrário, a ingestão a longo prazo de dietas ricas em fibra está associada a uma microbiota intestinal mais diversificada e, por isso, mais saudável.10
Aliás, foi realizado um estudo em que pessoas obesas consumiram, durante um ano, dietas com baixo teor de açúcares e hidratos de carbono, tendo-se verificado, no final desse período, uma diminuição da quantidade de firmicutes, bem como um aumento de bacteroidetes.4
Além de dietas pobres em fibra, existem ainda outros fatores que podem contribuir para desequilibrar a microbiota intestinal, nomeadamente11:
- sedentarismo (não prática de exercício físico);
- privação de sono;
- níveis elevados de stress;
- toma de antibióticos;
- alcoolismo crónico;
- baixa ingestão de alimentos ricos em probióticos.
Prebióticos, probióticos e simbióticos na prevenção da obesidade
A alteração da composição da microbiota intestinal por via da alimentação e do consumo de suplementos alimentares representa uma potencial terapêutica para o controlo e o tratamento da obesidade.5 Esta estratégia deriva da evidência de que qualquer alteração na composição da microbiota influencia o gasto de energia e a saciedade e, consequentemente, o ganho ou perda de peso.12
Deste modo, uma das formas de alterar a composição da microbiota intestinal cuja eficácia os estudos têm demonstrado é o consumo de prebióticos, probióticos e simbióticos (suplementos alimentares cuja composição combina pre e probióticos).4,6 Estes últimos, aliás, têm-se mesmo revelado mais eficazes nessa alteração do que os prebióticos ou probióticos isolados4. Além disso, os probióticos podem contribuir para a redução da gordura, do peso e do índice de massa corporal e para a prevenção do aumento de peso.6

Referências:
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- Gaio V, Antunes L, Barreto M, Gil A, Kislaya I, Namorado S, et al. Prevalência de excesso de peso e de obesidade em Portugal: resultados do primeiro Inquérito Nacional de Saúde com Exame Físico (INSEF 2015). Observações_ Boletim Epidemiológico Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge [Internet]. 2015 [citado 24 de março de 2022]; Disponível em: http://repositorio.insa.pt/bitstream/10400.18/5588/5/Boletim_Epidemiologico_Observacoes_N22_2018_artigo7.pdf
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